MAIO SCI-FI: SÉRIE – PHILIP K. DICK’S ELECTRIC DREAMS

“Philip K. Dick’s Electric Dreams” é uma série antológica de ficção científica baseada em alguns contos de Philip K. Dick, sua primeira temporada com dez episódios foi lançada pelo serviço de streaming Amazon Prime Video e produzida pela Sony Pictures. 

Para quem não conhece, Philip K. Dick foi um escritor americano de ficção científica, ele alterou profundamente o gênero literário e apesar de ter tido pouco reconhecimento em vida, as adaptações de deus diversos romances e contos para o cinema acabaram por tornar sua obra conhecida e aclamada não só pelos fãs, mas também pela crítica. Dentre suas obras mais famosas está “Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?”, que deu origem a nada menos do que ao clássico do sci-fi “Blade Runner”.

Diferente das séries antológicas que adaptam certo tema a cada temporada, como é o caso de “American Horror Story”, “Electric Dreams” funciona mais como a já mencionada “Lore” e “Black Mirror”, onde cada episódio é independente, sendo cada um baseado em um conto do autor.

The Hoodmaker

Em “The Hoodmaker” somos apresentados à uma sociedade onde os Teeps (telepatas) são altamente hostilizados pelos Norms (pessoas sem o dom da telepatia) e a decisão de inserir Teeps na força policial para ajudar em investigações tornam o confronto entre Teeps e Norms ainda mais sério. A coisa só piora quando um fabricante que produz uma touca que blinda a mente das pessoas contra a invasão telepática dos Teeps entra nessa guerra.

No meio dessa guerra, Ross (Richard Madden) é um agente que aceita como parceira a Teep Honor (Holliday Grainger) e aos poucos eles desenvolvem uma relação extra-trabalho que acaba deixando as coisas ainda mais complicadas.

Eu gostei bastante desse primeiro episódio e confesso que não conheço muito as obras do autor, então não espere que eu faça um comparativo obra x episódio. O episódio é bem dirigido, com um clima de suspense e desconfiança crescente, pois você fica querendo saber onde vai dar a relação de Ross e Honor, uma relação repleta de segredos. Além de ficar de olho na relação dos dois, também ficamos curiosos sobre a identidade do tal fabricante das toucas e enquanto essa investigação acontece, Teeps e Norms começam a entrar em um confronto perigoso e mortal. Você nem sente o tempo passar! “The Hoodmaker” merece um 4/5.

Impossible Planet

Dirigido por David Farr, o segundo episódio nos apresenta dois funcionários de uma empresa de turismo espacial,  Andrews (Benedict Wong) e Norton (Jack Reynor).

Andrew é um homem claramente insatisfeito e frustrado profissionalmente, porém acomodado demais para mudar sua realidade enquanto Norton é um homem que sente prazer com aquilo que faz mas está constantemente pressionado pela esposa a passar em uma espécie de concurso que fará com que ambos melhorem de vida e ascendam socialmente.

Ao final do expediente de mais um dia, ambos são abordados por Irma (Geraldine Chaplin) acompanhada de seu robô solicitando aos funcionários uma viagem para o planeta Terra, o problema é que o planeta Terra perdeu toda a vida devido a um “incêndio solar” catastrófico. Devido a quantidade exorbitante de dinheiro que a mulher oferece para ser levada ao planeta, Andrew convence Norton de que a chance de suas vidas acabou de bater a porta e assim, atendem ao chamado. Não tarda muito para Andrew perceber que a atitude foi errada e ele começa a realizar gestos compensatórios até que se vê cada vez mais ligado a tal senhora.

Eu achei linda a forma com a qual a felicidade é abordada na narrativa, tema que ao meu ver é o central do episódio. Temos logo no início dois funcionários vendendo uma felicidade falsa e artificial para as pessoas para depois descobrirmos que em suas próprias realidades eles se utilizam de métodos artificiais e escolhas falsas para se convencerem de que são felizes e quando a oportunidade de suas vidas aparece, mesmo sob pena de comprometer a felicidade alheia, eles a agarram, porém acabam tendo uma nova e emocionante lição. Foi por muito pouco que não caiu um cisco nos meus olhos ao final desse episódio. “Impossible Planet” merece um 5/5.

The Commuter

Ed Jacobson (Timothy Spall) é um funcionário de uma estação de trem que se alarma ao descobrir que vários passageiros estão pegando o trem com destino a cidade de Macon Heights, uma cidade que não existe.

Quando ele decide investigar por si mesmo, fica de cara a cara com uma realidade alternativa que o força a confrontar suas próprias lutas em torno de seu relacionamento com sua esposa Mary (Rebecca Manley) e seu problemático filho Sam (Anthony Boyle).

Sonhar não é a mesma coisa que desejar que seus sonhos sejam reais.

Macon Heights é retratada como uma cidade ideal, onde se pode ter uma vida perfeita, uma vez que ela não é tocada pela realidade e se mostra apenas para algumas pessoas escolhidas. Essas tais pessoas embarcam todos os dias no mesmo trem e no mesmo horário, saltam entre estações e adentram nessa cidade para viver o mesmo dia perfeito novamente para então voltar à sua realidade no final do dia. Porém, as escolhas, pensamentos e desejos que o visitante possui podem gerar reflexos em sua vida real e é justamente isso que acontece com Ed.

Após ter uma consequência em sua vida real, é levado a fazer uma escolha, viver sua realidade triste e fadada ao fracasso ou optar por mergulhar de vez na utopia e ser feliz. E você, o que escolheria?

O episódio é dirigido por Tom Harper, apesar de não ter nenhum visual fantástico como os dois primeiros episódios “The Hoodmaker” mais pós apocalíptico e noir e “Impossible Planet” que é ficção científica espacial pura, é excelente e muito bem feito, fisgando o telespectador mais pelo argumento e pela teatralidade do ator do que pelo visual. “The Commuter” merece um 4/5.

Crazy Diamond

Ed Morris (Steve Buscemi), um homem comum, é abordado por uma linda mulher sintética com um plano ilegal que pode mudar completamente sua vida. A partir do momento que Ed decide ajudar, seu mundo começa a desmoronar.

A direção de Marc Munden e a fotografia do episódio são lindas demais, é utilizada aqui uma paleta de verde que funciona e ajuda a transmitir a ideia de um mundo tóxico e em decadência, porém, pouco o episódio oferece além disso.

Todos os conceitos são simplesmente jogados e mal aprofundados o que é praticamente um crime para o gênero, uma vez que uma ficção científica que se preze precisa criar, desenvolver e fazer com que você acredite, se importe e sinta-se parte dessa nova realidade, tudo o que o roteiro desse episódio conseguiu fazer é com que o telespectador não desse a mínima nem para o universo e muito menos para o que iria acontecer com os personagens inseridos nele. Aqui há um desperdício grotesco de um trabalho que poderia ter rendido muito mais se o roteiro não fosse tão ruim. “Crazy Diamond” merece 2/5 e estou sendo legal.

Real Life

Com roteiro adaptado de Ronald D. Moore e direção de Jeffrey Reiner, o quinto episódio da série se passa em 2045, um futuro próximo onde as pessoas recorrem a um programa de realidade virtual para tirar umas férias da realidade.

É nesse contexto que conhecemos a policial Sarah (Anna Paquin) que se culpa por uma tragédia em seu passado e vive sob constante estresse até que ela resolve aceitar a sugestão de sua amorosa esposa Katie (Rachelle Lefevre) e tirar umas férias em uma simulação virtual, porém, não tarda para que Sarah comece a confundir a simulação com a vida real e essa confusão é repassada ao telespectador que fica sem saber ao certo o que é simulação e o que é a tal vida real na estória.

Eu simplesmente adorei o episódio por me deixar confuso, pois em ambas as situações haviam evidências de que aquela realidade que Sarah estava vivendo era a real e a dúvida é simplesmente massacrante e tudo só piora quando ela é obrigada a escolher entre uma dessas realidades. Real Life é 5/5 sem dúvidas!

Human Is

Em “Human Is”, Vera (Essie Davis) vive em um casamento sem amor com seu marido Silas (Bryan Cranston), porém, ao voltar de uma batalha no planeta distante, seu marido abusivo de repente parece ser um homem diferente em mais de uma maneira.

O ano é 2520 e a Terra como conhecemos está morrendo, nosso ar está contaminado e os nossos recursos estão cada vez mais escassos. Cientistas e Astronautas felizmente encontraram uma substância capaz de descontaminar o nosso ar e torná-lo respirável novamente, o único problema é que essa substância só pode ser encontrada e extraída no planeta Rexor IV e seus habitantes estão cansados dos visitantes que vão até lá roubar a substância e executar qualquer um que tente impedir.

E é dessa missão que Silas e mais um astronauta retornam com comportamentos diferentes, comportamentos estes que os levam a um julgamento para que seja descoberto se afinal eles são o que eram antes da expedição, ou se Rexorianos possuíram seus corpos.

O episódio dirigido por Francesca Gregorini é fenomenal em todos os sentidos, as atuações são incríveis, principalmente por parte da atriz Essie Davis, a abordagem de relacionamento abusivo e mansplaining são muito bem colocadas, além da questão principal que é a exploração de recursos naturais e a falta de humanidade do ser humano quando sua sobrevivência está em jogo. “Human Is” é 5/5!

Kill All Others

Um cadáver é pendurado em um outdoor e é inexplicavelmente ignorado pelos transeuntes. A única candidata (Vera Farmiga) do que é em 2050 considerada uma Grande Nação, faz uma declaração chocante na TV aberta encorajando a violência, que também é inexplicavelmente ignorada pela mídia e telespectadores. Quando Philbert Noyce (Mel Rodriguez) se atreve a questionar a situação, acaba tornando-se um alvo instantâneo.

A mensagem do episódio dirigido e roteirizado por Dee Rees ficou um pouco confusa de início, porém, com posterior reflexão, notei que o episódio é uma crítica ao humano alienado que é facilmente encantado por palavras bem colocadas e ditas de forma doce, enfeitiçado por prazeres esdrúxulos e manipulado ao ponto de ignorar certos acontecimentos para se encaixar em um molde, afinal, ninguém quer discutir, questionar e correr o risco de ser marginalizado e até hostilizado pela sociedade. Felizmente essa visão de futuro de Philip K. Dick é menos massiva na nossa realidade do que acontece em seus sonhos elétricos. “Kill All Others” merece um 3/5.

AUTOFAC

A sociedade e o mundo que conhecemos entraram em colapso no episódio dirigido por Peter Horton. Uma fábrica gigantesca e automática opera de acordo com os princípios do consumismo; os seres humanos consomem para serem felizes, e para consumir continuamente, eles devem ser negados a liberdade de escolha e livre arbítrio. Enquanto continua fabricando, a qualidade do ar e do meio ambiente se deteriora cada vez mais, até que um pequeno bando de rebeldes decide fechar a fábrica, mas nessa missão acabam descobrindo que, na verdade, eles podem ser os consumidores perfeitos.

Esse episódio é cheio de reviravoltas inesperadas, o grupo de humanos rebeldes liderado pela forte e badass Emily Zabriskie (Juno Temple), cansado de ver a AUTOFAC despejar seus produtos, poluir os rios e ar, decidem fechar a fábrica e para isso abatem um dos drones entregadores, hackeiam seu sistema e solicita um funcionário da empresa para vir buscar e reparar o tal drone, quando na verdade planejam sequestrar o funcionário e forçá-lo a levá-los até a AUTOFAC e destruí-la. Porém, eles são surpreendidos com a chegada de uma androide, Alice interpretada pela cantora e agora também atriz Janelle Monáe, o que não os impede de fazer um novo hack e irem atrás de seu objetivo principal, porém, chegando lá acabam por descobrir segredos que deveriam ter sido mantidos ocultos. “AUTOFAC” é 4/5.

Safe and Sound

O penúltimo episódio da série, dirigido por Alan Taylor, responsável por dirigir “Thor: O Mundo Sombrio” e alguns bons episódios de “Game Of Thrones”, é sem dúvida alguma um dos meus favoritos, senão o meu favorito da primeira temporada, pois ele conseguiu atingir minha memória afetiva e me lembrou muito da época em que assistia séries como Clube do Terror (que vai ter uma adaptação cinematográfica em breve) e Além da Imaginação.

Na trama, Foster (Annalise Basso) é uma garota dominada pela ansiedade social que vivia em uma das bolhas mundiais, uma espécie de cidade pequena, pobre e isolada de tecnologia, até mudar-se com sua mãe Irene (Maura Tierney) para uma cidade grande. Pela primeira vez em sua vida, Foster está exposta a  sociedade urbana que enfatiza a segurança e prevenção ao terrorismo. Seus dias de escola são consumidos por medo e paranoia, mas ela encontra a orientação e companhia nos lugares mais inesperados.

Eu não posso falar muito sobre o episódio por conta de suas reviravoltas, qualquer coisa que eu fale aqui pode ser um spoiler que estrague a experiência de quem for assistir ao episódio. O que posso comentar é que a atriz Annalise Basso está incrível nesse episódio, transmitindo toda a emoção e confusão da personagem somente com o seu olhar e fisicalidade, é bonito assistir e garanto que o final do episódio vai ter deixar bem pistola! “Safe and Sound” é 5/5!

The Father Thing

O último episódio de Electric Dreams tem uma vibe bem Stephen King, dirigido por Michael Dinner o episódio retrata o nosso mundo sob um ataque alienígena bem discreto.

Charlie (Jack Gore) é um garoto que precisará tomar uma difícil decisão para proteger sua mãe e a raça humana, pois ele parece ser o único a perceber que os seres humanos estão sendo aos poucos substituídos por monstros perigosos. A premissa do episódio está longe de ser algo original, o charme do episódio consiste na forma com a qual a relação pai e filho é construída para logo depois ser colocada à prova.

Sem dúvidas, “The Father Thing” encerra essa primeira temporada de forma agradável, colocando o elemento invasão alienígena no pacote, que é tão intrínseco ao gênero da ficção científica. “The Father Thing” é 4/5!

“Electric Dreams” é uma ótima forma para se conhecer o trabalho do visionário autor Philip K. Dick, a série é recheada de argumentos, conceitos e críticas interessantes e ainda pertinentes, além de possuir uma fotografia linda, trilha sonora imersiva e atuações maravilhosas, o elenco escolhido para a série é no mínimo incrível. Como em toda série antológica, há episódios mais fortes e mais fracos, porém, no final das contas, a série consegue entregar uma temporada consistente, sem muitos deslizes e que com chances de se tornar uma série importante para a cultura pop!

A Editora Aleph lançou recentemente uma coletânea reunindo os dez contos que inspiraram essa primeira temporada da série e você pode adquirir a coletânea Sonhos Elétricos clicando aqui.

Quantos cafés elétricos a primeira temporada de “Philip K. Dick’s Electric Dreams” merece?

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