LIVRO: A FACE SERENA – MARIA VALÉRIA REZENDE

“A Face Serena” é uma livro de contos da autora brasileira Maria Valéria Rezende, ganhadora de importantes prêmios da literatura como o Prêmio Jabuti em 2009, 2013 e 2015, o Prémio Casa de las Américas e o Prêmio São Paulo de Literatura em 2017. A coletânea de contos foi publicada no ano passado pela Editora Penalux e reúne trinta e sete textos da autora.

Eu não conhecia a escrita de Maria Valéria Rezende até então, porém, eu já tinha ouvido e lido seu nome nos grupos literários cujos quais participo. Durante o especial #JulhoNacional, a Editora Penalux me enviou um exemplar de “A Face Serena” para que eu pudesse conhecer também a autora, uma vez que estava conhecendo escrita e obras de autores nacionais pelos quais nutria certa curiosidade há um bom tempo, tal como Ana Paula Maia e seu incrível “Enterre Seus Mortos”.

Diferente do que fiz na minha resenha de “Novena Para Pecar em Paz”, não farei um texto de impressões de todos os contos, pois são muitos, citarei aqui os que mais despertaram a minha atenção.

“O Crítico” é um conto que narra a estória de um homem que desde sempre foi recluso, pouco aceito e que viu nos estudos uma forma de ganhar notoriedade, por isso, se aprofundou nos estudos do português e da literatura ao ponto de tornar-se um crítico literário e começar a exercer a função. O problema é que a notoriedade que ele conquistou com seu talento para analisar textos não lhe é o suficiente, seu anseio maior é tornar-se escritor e ser visto e reconhecido por suas obras e ele tem a convicção de que por ser um ótimo crítico, suas ficções serão soberbas, será mesmo?

Em “Tudo Pela Beleza”, a autora nos apresenta uma personagem desesperada por ser bonita, ser reconhecida como bonita em seu prédio, nas ruas e onde houver olhos para apreciarem seus sacrifícios realizados em nome da aparência. Aqui a máxima “por fora bela viola, por dentro pão bolorento” é utilizada de uma forma inteligente e irônica, quando a autora coloca em cena um fotógrafo em busca de uma musa perfeita para um concurso fotográfico.

Em “Eclipse”, Ana Clara descobre seu primeiro e amor ainda jovem em meio à uma brincadeira de pique-esconde na casa de sua tia, onde se esconde com seu primo em um guarda-roupas. A autora se utiliza desse primeiro encontro no escuro, em um lugar apertado e em um contexto proibido para moldar os pensamentos de Ana Clara acerca da relação com o primo, que vai se desenvolvendo também às escuras, até que a claridade entra para mostrar para Ana que nas brincadeiras de pique-esconde da vida, às vezes ganha quem se arrisca a sair do esconderijo e se salvar.

“Requadrilha” me fez rolar de rir, aqui a autora reimagina o final do poema “Quadrilha” de Carlos Drummond de Andrade de uma forma impagável, dando um final diferente e esclarecendo algumas informações “incorretas” sobre o futuro e o passado dos personagens que amavam outros que por sua vez amavam outros. Sensacional!

Já em “Conto de Natal”,  Nonato faz de tudo para ter a tradição de passar a noite de natal na casa de seu irmão mais velho que foi agraciado com os estudos que os pais poderiam bancar apenas para um filho, pois aquela noite sempre foi e sempre será a noite mais especial o dia mais especial, a data mais importante do ano. Esse conto vem logo após o “Requadrilha” e enquanto este me fez rir, “Conto de Natal” me fez sentir um grande nó na garganta.

Em “Clichê”, o que me conquistou foi o jogo de palavras utilizado pela autora, o bafo de álcool como metáfora para uma relação familiar desgastada, até que alguém resolve colocar um ponto final.

…Pois é, não aguento mais o cheiro desses carinhos.

“Pelas Superfícies” é um thriller psicológico muito bom, no conto o jovem fotografo Lúcio é encantado por fotografar vidraças, não são os reflexos ou o que há por trás do vidro que lhe encanta, o que lhe faz brilhar os olhos são as superfícies. Porém, certo dia ao usar uma configuração incorreta para fotografar, Lúcio acaba fotografando uma cena de um crime e só percebe ao chegar em casa e analisar as fotografias do dia. A fotografia o choca e o perturba ao ponto de ficar obcecado pela imagem e por tentar descobrir onde foi que tirou, a sua perturbação afeta seu trabalho, suas relações e seu amor pela fotografia até que uma luz no final do túnel aparece, mas seria um luz boa ou a luz do fim?

Em “Laudo”, o perito Nietzsche da Silva Santos nos oferece seu parecer técnico e filosófico sobre a causa mortis de Daisy Margarida, uma prostituta encontrada morta em um viaduto por funcionários públicos responsáveis pela limpeza do local. Essa premissa pode parecer simples, porém, o laudo final do perito sobre a morte de Daisy é sensacional e triste.

O conto que finaliza a antologia e empresta o nome ao livro “A Face Serena” conta a estória de Benvinda que já nasceu desperta com olhos vivos e que pareciam ávidos por algo que ninguém sabia dizer o que é e assim cresceu, tendo passado por mudanças corporais advindas do tempo, porém, algo nunca mudou, seu olhar de quem espera por algo, de quem sabe que há alguma coisa reservada para ela, seu olhar que já conhece o próprio destino.

“A Face Serena” de Maria Valéria Rezende é uma antologia com contos que refletem assuntos cotidianos, com personagens verossímeis e bem construídos, a autora se utiliza de metáforas, ambiguidades e bom humor para construir palavras que incomodam, aliviam, faz rir e refletir sobre traços da condição humana, aspectos sociais e culturais. A capa da obra que trás uma locomotiva em uma perspectiva quase que retratada pelo personagem do conto “Pelas Superfícies” reflete bem o espírito do livro, aqui temos uma viagem de trem onde cada parada é um convite a conhecer um pouco mais sobre o que nos faz ser o que somos.

Você pode adquirir a obra na loja oficial da Editora Penalux.

Quantos cafés “A Face Serena” merece?

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