“Um Casamento Americano” é o quarto romance publicado pela autora Tayari Jones. Nascida em Atlanta, já recebeu o Hurston/Wright Legacy Award na categoria de melhor livro de estreia com “Leaving Atlanta” (2002) e teve seu mais recente trabalho “An American Marriage” selecionado para o Clube do livro da Oprah, além de ter sido escolhido para a lista de leituras de verão de Barack Obama. A obra foi publicada Brasil em Janeiro pela TAG – Experiências Literárias em parceria com a Editora Arqueiro para os assinantes do plano TAG Inéditos.
Recém-casados, Celestial e Roy moram em Atlanta, Geórgia, e são a personificação do sonho americano: ela é uma artista em ascensão e ele, um jovem executivo. Mas, durante uma viagem ao estado de Louisiana, Roy é preso e condenado a 12 anos de reclusão por um crime que não cometeu. Separados pela injustiça racial, os dois precisam encontrar uma forma de salvar seu casamento e de superar as circunstâncias adversas.
Roy é filho único de uma família simples, sua mãe foi abandona pelo namorado ainda grávida e, após ter o filho, conheceu o homem que viria a ser seu marido e por consequência padrasto de Roy. Juntos, o casal sempre fez o possível para criar o filho de maneira correta para que ele viesse a ser uma pessoa bem sucedida. Roy acaba se tornando um jovem executivo com um perfil empreendedor sem nunca esquecer de suas raízes e da educação adquirida, ele é descrito como um homem integro e apaixonado.
Celestial também é filha única, porém teve um pouco mais de sorte na vida, seu pai cientista conseguiu criar a fórmula que posteriormente vendeu para uma grande marca de sucos de laranja e com isso, a família não precisa mais se preocupar com questões financeiras. Celestial é descrita como uma mulher forte, independente e com garra suficiente para se fazer cumprir todos os seus objetivos, ela trabalha criando bonecas para um seleto público de colecionadores.
O relacionamento dos dois não é um mar de rosas, é aquela velha história de que você só conhece de verdade uma pessoa quando começa a dividir o teto com a mesma. De pouco em pouco, Roy e Celestial vão contando seus respectivos segredos e fatos do passado um ao outro, sendo por vontade própria ou à força quando um ou outro descobre um desses segredos ou fatos. Essa quantidade de coisas não ditas entre eles torna a relação instável, mas um sempre se esforça para reconstruir as estruturas quando o relacionamento parece estar cedendo e dessa forma vão caminhando e construindo uma vida juntos.
A autora estudou sobre condenações injustas nos Estados Unidos e queria escrever sobre o tema, certo dia ao ouvir uma conversa, o enredo de “Um Casamento Americano” se formou em sua mente. A promissora união é interrompida quando Roy é acusado, preso e sentenciado a prisão por estuprar uma mulher que afirma tê-lo reconhecido, afinal foi um homem negro que entrou em seu quarto a noite e a estuprou e Roy era o homem negro mais próximo.
Nos Estados Unidos, um em cada três homens negros tem chance de ser preso em algum momento da vida, enquanto a probabilidade entre os brancos é de um em cada dezessete de acordo com o The Sentencing Project, apesar de apenas 13% da população norte-americana ser afrodescendente, 46% dos presos por engano no país são negros, um prisioneiro negro cumprindo pena por assédio sexual tem 3,5 mais chances de ser inocente do que um homem branco condenado pelo mesmo crime e afro-americanos têm sete vezes mais chances de serem sentenciados por crimes que não cometeram do que pessoas brancas de acordo com o The National Registry of Exonerations.
O racismo e imperícia institucional condenam Roy somente com o reconhecimento da vítima, sem dar espaço para as provas de poderiam inocenta-lo. Abalada, Celestial recorre ao tio advogado para mover ações com o objetivo de reverter a condenação do marido, porém o processo é lento e os recém-casados precisam encontrar uma maneira de fazer a relação funcionar.
Enquanto aguardam os trâmites judiciais, Roy e Celestial se comunicam através de cartas, tudo vai bem no começo, porém aos poucos as brigas começam a acontecer, mais segredos começam a se levantar contra a relação e o tempo cumpre seu papel de distanciar os recém-casados, até o dia em que o tio de Celestial finalmente consegue tira-lo da prisão e eles precisarão lidar com todas as mudanças que ocorreram durante o tempo no qual Roy esteve preso.
O inicio do livro é muito bem executado, conhecemos os personagens por meio de seus pontos de vista (há na estória os pontos de vista de Roy, Celestial e André, amigo de infância de Celestial e colega de classe de Roy), o que ajuda o leitor a entender um pouco melhor sobre as ações que os personagens cometem durante a trama além de não deixar a estória inteira a cargo de apenas um personagem, o que tornaria o narrador não tão confiável.
Em sua segunda parte acompanhamos a troca de cartas entre o casal e as consequências do distanciamento físico em suas vidas, descobrimos o que acontece no mundo lá fora mediante as descrições que Celestial envia para Roy e somente pela visão dele conseguimos entender sua realidade degradante na prisão. Apesar de não ter um ritmo tão bom quanto a primeira parte, somos fisgados pela transformação na vida do casal e pelo rumo que as coisas tomam. O problema mesmo está na conclusão do livro, onde Roy consegue sair da prisão, mas se depara com as consequências de sua ausência.
Em diversas passagens do livro há uma discrepância da descrição das características dos personagens com as ações que eles tomam durante a história, mas na conclusão esse problema toma grandes proporções, há um personagem ganhando traços violentos e uma personalidade pra lá de abusiva, enquanto personagem descrito como forte durante toda a obra, demonstra uma personalidade insegura, falta de pulso firme e até mesmo um ar de vitimismo que não convence e até chega a irritar, eu me incomodei bastante e me surpreendi negativamente com o cunho machista da obra. Infelizmente a crítica do livro fica em segundo plano, a autora prefere dar foco ao drama enfrentado pelo casal em uma esfera mais ligada a relação e aos sentimentos e toda a questão do racismo nos EUA e as injustiças sofridas pelos negros no país funciona apenas como pano de fundo para a história de Celestial e Roy e um triângulo amoroso desnecessário.
“Um Casamento Americano” é um livro com uma ótima premissa de discussão, porém prefere abordar questões de relacionamento ao invés de se aprofundar na questão social, política e racial como sua sinopse insinua. O livro também peca ao descrever os personagens de uma determinada forma que difere muito de suas ações, também há diversos problemas de cunho machista na obra, o que me surpreendeu negativamente. Ao finalizar a leitura eu me senti um tanto quanto enganado por ter comprado a ideia de um livro que discutiria um assunto sério e ter recebido um drama de relacionamento com direito à um triângulo amoroso sem muito propósito e todos os clichês de romances que só serviram para diminuir a relevância da obra, me desculpe USA Today, mas “Um Casamento Americano” está bem longe de ser brilhante ou inesquecível, é apenas ok.
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Quantos cafés “Um Casamento Americano” merece?
Odeio triângulo amoroso. Já é difícil achar um que se interesse pela gente, quem dirá dois. Isso só acontece na ficção mesmo. E me sinto tapeado quando um livro promete tratar de questões relevantes e acaba caindo nos clichês de sempre, não que ler clichês não seja divertido, mas acaba sendo um desserviço as questões tratadas.
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Rodrigo, eu detesto triângulos amorosos e detesto mais ainda ser enganado por uma sinopse 😢
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