JULHO NACIONAL: CANTO ESCURO: DANIEL BARROS

“Canto Escuro” é o mais recente trabalho do autor alagoano Daniel Barros, lançado este ano pela Editora Penalux. “O Sorriso da Cachorra”, “Enterro sem Defunto” e “Mar de Pedras” são algumas das publicações anteriores do autor que possui grandes influências de literatura policial em sua escrita, porém, este é o meu primeiro contato com uma de suas obras.

Ambientada em Brasília, a trama nos apresenta o cotidiano de Paulo Henrique, um servidor público que atua no setor de compras de sua repartição, responsável por verificar a conformidade de processos da área. Adepto da boêmia, o personagem é presença constante nos bares da cidade e também nas festinhas promovidas por seus melhores amigos policiais, festinhas regadas a álcool e prostituição.

Paulo chama atenção das garotas que leva para a cama por não ser apenas mais um homem interessado apenas no serviço que adquiriu, ele se importa com as garotas. O tratamento que confere à elas faz com que muitas se afeiçoem e passem a conceder certos privilégios ao rapaz, há um caso em especial onde a afeição mútua chega ao ponto de Paulo querer tirar uma dessas garotas da vida de programas, porém como ela mesma diz, nem todas as garotas da noite são vítimas, há aquelas que optam por viver uma vida de luxos à viver servindo em uma empresa que não lhe pagará por mês o que se ganha em apenas uma noite.

Dividindo sua vida entre o expediente na repartição e as farras com os amigos, Paulo leva uma vida tranquila, até que as inúmeras tentativas de cooptação que sofre diariamente na repartição, o leva a descobrir um esquema de corrupção dentro de sua área. Indignado com a corrupção se alastrando na repartição que trabalha, ele busca em seus amigos policiais e em Ximenes, um investigador especializado em crimes de corrupção, uma forma de desmantelar o esquema criminoso.

O problema é que, conforme as investigações avançam, descobre-se que o esquema abrange esferas maiores do poder. Como tudo precisa ser feito de forma cuidadosa e extremamente sigilosa, as investigações acontecem lentamente e a falta de resultados imediatos corroem a mente de Paulo, que começa a sentir sua vida também ser corroída e o grande canto escuro de sua alma torna-se maior, na medida que também torna-se um refúgio.

A narrativa do romance não é linear, temos logo nas primeiras páginas um capitulo que na verdade se refere à um dos momentos finais da trama, esse artifício confere à leitura um clima intrigante e instigante de mistério crescente. Conhecemos a vida do personagem enquanto trabalhador, cumprindo sua rotina tediosa, suas constantes negativas às tentativas de cooptação, suas farras com os amigos e prostitutas, relações amorosas, amadurecimento, casamento e constituição de uma família e suas complicações, tudo isso de forma não linear, cabendo ao leitor ir descobrindo e montando a linha temporal correta aos poucos.

Os personagens criados por Daniel Barros são extremamente críveis e humanizados, não há nenhum super herói ou salvador da pátria aqui, todos eles possuem camadas que vão muito além das aparências que tentam demonstrar, a exemplo do protagonista que é um símbolo de honestidade no trabalho, mas não é tão correto em suas relações amorosas e possui diversas atitudes e hábitos condenáveis pelo que a nossa sociedade julga correto, assim, Paulo tenta viver a vida da forma mais correta o possível, mesmo sabendo que nem sempre é possível.

As constantes contradições comportamentais dos personagens trazem um tom reflexivo à trama sem pretensiosismo, afinal, as reflexões partem de acompanhar uma rotina extremamente comum, de um personagem extremamente humano que precisa lidar com demônios externos e internos enquanto tenta seguir sua filosofia do que é correto, tomando atitudes que nem sempre vão parecer corretas para o leitor. A solidão, o canto escuro na mente, peito e alma do protagonista, também é um elemento interessante na trama. A boêmia, as mulheres, o casamento não se mostram suficientes para preencher esse buraco que ele só permite exposição para si mesmo, em um cômodo trancado, enquanto a água escorre do chuveiro, na tentativa de levar as aflições, arrependimentos e vazio para o ralo.

A leitura foi uma experiência prazerosa e bem rápida, devorei o livro com o intuito de descobrir o resultado das investigações e de que forma a história chegaria até a cena apresentada no primeiro capítulo, foi muito interessante conhecer os personagens criados por Daniel Barros, a esposa de Paulo Henrique é uma atração à parte nesse romance, eu simplesmente queria entrar no livro e pagar uma boa sessão de terapia pra ela, bem, para o Paulo também, mas por motivos diferentes. A minha unica ressalva fica por conta conta do desenvolvimento, como o meio foca bastante na rotina do personagem e em sua vida boêmia, em certos momentos a leitura ficou um tanto quanto repetitiva, mas nada que estragasse a experiência de leitura.

“Canto Escuro” é uma obra interessante e instigante, que vai te fazer refletir sobre diversos assuntos, como a corrupção, no núcleo onde acompanhamos as tentativas de um investigador, dois policiais e um funcionário público de desmantelar um esquema de corrupção estrutural, a prostituição, traição, relacionamentos abusivos e de certa forma a depressão na medida que acompanhamos os desdobramentos das ações de Paulo Henrique. Com toda a certeza lerei mais obras do Daniel em breve, e você, já conhece as obras do autor?

Gostou das minhas impressões de “Canto Escuro”? Você pode adquirir o seu exemplar diretamente na loja da Editora Penalux. Conheça mais sobre o autor acessando sua página no Instagram.

Quantos cafés “Canto Escuro” merece?

13 comentários sobre “JULHO NACIONAL: CANTO ESCURO: DANIEL BARROS

  1. Ana Ramos disse:

    Meu exemplar de Canto Escuro já está aqui ansioso para chegar a vez dele na pilha de leituras. Tô curiosa para conhecer esse Paulo Henrique, acho um nome bem bonito Hahahaha
    A resenha, como sempre, está maravilhosa! Parabéns!
    Beijos!

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