LIVRO: NINGUÉM NASCE HERÓI – ERIC NOVELLO

“Ninguém Nasce Herói” é uma fantasia urbana escrita pelo autor, tradutor e roteirista Eric Novello, lançada em 2017  pela Editora Seguinte. O autor possui diversas obras já publicadas como “Sabor da Maré” (Agência Página 7, 2019), “Exorcismos, Amores e Uma Dose de Blues” (Gutenberg, 2014), “A sombra no sol” (Draco, 2012), “Neon Azul” (Draco, 2010) e “Histórias da noite carioca” (Lamparina, 2004).

Ele era apenas um deputado bagunçando a Comissão de Direitos Humanos, mas ele assumiu a presidência da Câmara dos Deputados, ninguém se preocupou muito, acharam graça em suas atitudes e falas inescrupulosas, pensaram que ele logo ia acabar se enforcando com sua própria corda, enquanto isso, ele organizou e liderou uma votação para acabar com os direitos trabalhistas. O povo dizia que nenhum partido iria aprovar esse tipo de conduta, que logo ele se enforcaria com a própria corda, mas ele não se enforcou coisa nenhuma, avançando degrau à degrau ele tornou-se o maior representante do país.

Ele é O Escolhido para reger o país em um regime de governo fundamentalista que deixou em êxtase a classe média branca do país, empolgada com as melhorias do setor econômico e na preservação e propagação dos preceitos intrínsecos as “famílias de bem”. O fundamentalismo não tardou em fazer com que ratos e baratas saíssem dos esgotos e começassem a se organizar em grupos extremistas, cujo objetivo consiste em eliminar aqueles que não se enquadram no que prega o livro religioso que rege os preceitos desse governo. Esse grupo extremista, que se auto-denomina A Guarda Branca, age de forma a exterminar, sim matar mesmo, aqueles que, de acordo com as suas visões extremistas e preconceituosas, são a escória da sociedade, a parcela da sociedade que vive em pecado e precisa pagar por isso.

Obviamente, nem todos estão contentes com as ações da Guarda Branca, os constantes confrontos entre a polícia, a população e os extremistas fazem com que O Escolhido tome a atitude de assinar um Pacto de Convivência, mas levando em conta tudo que eu disse até então sobre esse homem e esse regime, não é difícil imaginar que esse Pacto não é bem aquilo que parece ser.

Nesse cenário “distópico”, conhecemos Chuvisco, um jovem tradutor morando em São Paulo, e seus amigos. Nem Chuvisco e nem seus amigos engoliram muito bem a história desse Pacto de Convivência e eles testam essa teoria entregando livros pela cidade, o que se mostra uma tarefa bem perigosa e reforça a ideia de que esse pacto é nada mais que BULLSHIT!

Como o governo é pautado por preceitos de um livro religioso, a leitura de qualquer outro tipo de literatura é desencorajada, para não dizer proibida (nossa o que houve na Bienal ano passado mesmo?), logo, o simples ato de distribuir livros considerados pagãos em praça pública (Felipe Neto obrigado por distribuir todos aqueles livros proibidos na Bienal) é motivo suficiente para ser perseguido pela Guarda Branca ou dissuadido pela polícia.

Chuvisco é um jovem assexual, que tinha um canal no Youtube que funcionava meio que como um exercício de terapia proposto pelo seu terapeuta que ele carinhosamente chamava de Doutor X. O Doutor X ajudou muito Chuvisco com sua condição psicológica pecúliar, nosso protagonista é constantemente acometido por situações onde não consegue separar sua imaginação da realidade, episódios que eles chamam de Catarses Criativas. Essas catarses criativas são os elementos fantásticos da trama, constantemente Chuvisco atribui poderes e habilidades super-humanas a si mesmo e aos seus amigos, enxerga tartarugas gigantes caminhando por aí e causando tremores, borboletas com asas de pétalas de rosas multicoloridas e outras situações. Esse elemento vai sendo apresentado aos poucos e essa mistura faz com que o leitor entenda as peculiaridades da mente do protagonista.

A trama é recheada de representatividade, temos personagens de diferentes etnias, orientações sexuais e religiões se unindo de forma natural e lutando da forma que podem contra um regime que os quer ver mortos. Assim, somos convidados pelo autor à vislumbrar como seria a vida dessas minorias caso um regime fundamentalista entrasse em vigor cof cof e, o mais interessante na abordagem que o autor escolheu usar para abordar tudo isso é que ele não se restringe a falar sobre como minorias seriam afetadas, pois em um sistema desses, todos são afetados, ou você acha que uma mãe vai sentir em seu coração que o seu dever patriótico é ver seu filho sendo espancado até a morte no meio da rua por ser diferente daquilo que um livro prega?

Embora eu tenha gostado muito de todos os elementos, todas as questões discutidas, dos personagens e da narrativa do livro, senti falta de ação e de uma resolução menos apressada, há um corte perto do final que foi um tanto anti-climático pra mim, o que me fez tirar alguns pontos na minha avaliação do livro. Obviamente essa é uma impressão pessoal minha durante a leitura e de forma alguma tira o valor de tudo que o autor construiu nessa obra, inclusive, particularmente acho que esse livro deveria ser distribuído nas escolas para que os nossos futuros adultos não façam a merda que os adultos do presente fizeram e continuam fazendo, aparentemente cegos à quantidade de sandices que o líder político de merda que colocaram no poder.

“Ninguém Nasce Herói” é uma leitura necessária que, infelizmente, não pode ser considerada uma distopia tendo em vista a quantidade de aspectos relacionáveis com a nossa situação atual. Bem escrito, com uma narrativa fluída, personagens interessantes, diversos e complexos, esta é uma obra necessária para os tempos atuais e para os tempos que virão à seguir, afinal, a memória do ser-humano já se provou seletiva e fraca em diversos momentos da história, “Ninguém Nasce Herói” está aqui para lembrar todos nós que a fusão da política com a religião é uma ideia de merda e que o fundamentalismo e qualquer outra forma de extremismo são rotas diretas para o massacre e sangue inocente sendo derramado em nome de um deus que definitivamente não é aquele que morreu em uma cruz pregando amor ao próximo.

Gostou das minhas impressões e ficou com curiosidade de ler a obra? Adquira agora mesmo “Ninguém Nasce Herói” em formato físico ou digital.

Quantos cafés “Ninguém Nasce Herói” merece?

2 comentários sobre “LIVRO: NINGUÉM NASCE HERÓI – ERIC NOVELLO

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