“Boneca” é um conto de mistério, suspense e ficção científica da autora, revisora e editora Clara Madrigano, lançado ano passado de forma independente em formato digital. Eu já conheço a escrita da Clara por meio de alguns contos como “O Regresso” (“Aqui quem fala é da Terra”), “Dodge”, “As Boas Damas” e “Wildwood” (“Mulheres vs. Monstros”) e sempre me surpreendo com a capacidade da autora de me surpreender com poucas páginas.
Na trama conhecemos Ari, uma garota que acorda todos os dias em um cativeiro onde nada falta. David, seu captor, abastece o porão com bonecas, brinquedos e roupas rendadas e cheias de laços, ele é seu único contato e também o único empecilho entre ela e a liberdade.
Ela já não se recorda da sensação do calor do sol esquentando seu corpo, faz muito tempo que Ari está ali. As únicas e raras oportunidades de sair daquele espaço confinado são concedidas por David em forma de jantares regados à fast-food e por meio da leitura de uma espécie de diário que encontra escondido dentro do porão.
Esse diário foi escrito por uma garota e Ari começa a refletir sobre o que teria acontecido com ela e inevitavelmente, sobre o que virá a acontecer consigo. Esse fato faz com que a garota comece a planejar sua fuga daquele lugar, antes que ela descubra ou acabe por ter o mesmo fim que a garota que escreveu esse diário. Mas, o que fazer quando ela finalmente conseguir se ver livre daquele lugar?
Como eu citei logo no começo desse texto, Clara Madrigano sempre me surpreende! Eu nunca poderia imaginar os rumos que essa história acaba tomando e, mesmo sabendo que as histórias da Clara sempre reservam algumas surpresas, eu não estava preparado para as surpresas desse conto.
A história tem pouco mais de vinte páginas, mas me deixou pensativo sobre diversas coisas, eu não sei bem se foi por conta de leituras recentes que de alguma forma conversam com o conto (esse conto caberia facilmente na antologia “Vislumbres de um futuro amargo” justamente por ser um vislumbre de um futuro super amargo), mas eu me peguei pensando sobre as relações tóxicas e doentias de posse e como a tecnologia pode contribuir para tornar casos absurdos e monstruosos que acontecem diariamente ainda piores em diversos sentidos.
“Boneca” me deixou pensando sobre até onde uma pessoa estaria disposta a ir para saciar um desejo patológico e também sobre as concessões que a nossa sociedade ainda dá para casos de abuso doméstico. Falas como “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, pensamentos que anulam abusos em esfera matrimonial simplesmente pelo pensamento escroto-machista de que a mulher pertence ao marido à partir do momento que diz sim aos momentos de alegria e tristeza e até o próprio ritual de transferência de posse do pai para o marido foram algumas coisas que ficaram na minha cabeça após a leitura, mesmo que a história não aborde especificamente esses assuntos. Clara Madrigano nos oferece uma visão muito interessante sobre um assunto muito complicado e consegue surpreender, entreter e fazer com o leitor se pegue refletindo por horas após concluir a leitura.
Gostou das minhas impressões sobre o conto? “Boneca” está disponível em formato digital, compre pelo link do blog (https://amzn.to/317ZO7k) e colabore com o trabalho desse criador de conteúdo viciado em café.
Quantos cafés “Boneca” merece?
Esse conto é bem bom mesmo. Mas ele já faz parte de uma coletânea. Se não me engano é a do Universo Desconstruído Volume 2. Você baixa esse livro de graça, só dar uma busca no Google.
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